Vamos lá, viajar *

 Arte

Milton Nascimento teria a fugacidade de Jessé ou Tadeu Franco sem Fernando Brant.
 Alma, o Clube da Esquina tinha demais. 
Timbre, extensão vocal, oitavas, falsetes, Beatles, Burt Bacharach, progressivo, barroco, bossa-nova, lavadeiras, ladainhas, guarânias e calangos. 
Wagner Tiso, Toninho Horta, Flávio Venturini, Tavinho Moura, Novelli, Nivaldo Ornelas...

 Corpo era Fernando Brant. 
Alma preenche, comove e esvai. Quem penetra e fecunda é a carne.

Brant nos deu algo concreto pra pegar e levar daquela viagem sonora original. Chegou manso aos festivais de música, em 1967, arrebatando gentes dos quatro cantos.


Ronaldo Bastos, Murilo Antunes, Márcio Borges e outros assinam músicas memoráveis no Clube. 

Mas Brant não foi só o mais fértil, além das 200 músicas, segundo pesquisadores. 

Compreendeu melhor o caldeirão de influência dos parceiros e quem mais bem traduziu a mineiridade para a linguagem universal da arte, sem pasteurizações.


Na trilha antropofágica dos instrumentistas, pegou o mundo, embalou de Minas e devolveu 


Suas letras acharam um ponto comum aparentemente improvável entre a inocência da música jovem da década de 60 e a caipirice. Tocaram os urbanos da beira-mar e os matutos ribeirinhos.


Num desses casos raros de sofisticação e sucesso, as canções saltaram as divisas mineiras direto para intérpretes do  primeiro time da MPB quase ao mesmo tempo em que eram gravadas pelo Clube da Esquina.


Brant não era exatamente um poeta. 
Era um letrista de versos grudentos sem chavões ou lugares comuns.


Foi o esqueleto que pôs de pé e deu coragem de caminhar sozinho alguns de seus músicos. 




A afinidade entre os membros do grupo resultou no que é um dos melhores álbuns da música brasileira de todos os tempos. O Clube da Esquina 2 tem cinco letras de Brant. De sua descrição da procissão de Corpus Christi em Ouro Preto participam quase todos os principais membros do grupo. O corpo e a alma, inteiros.



Fernando Brant foi cedo, 68 anos, de complicações no transplante de fígado. Partiu menino. Como sempre quis ser.




 * O título é um verso de "Manuel, o audaz", escrita por Fernando inspirado em seu jipe.