O jesuíta não vem?

"A novidade é que o Brasil não é só litoral, é muito mais que qualquer zona sul..."
( Milton Nascimento/ Fernando Brant)
O jesuíta virá com o Papa?
A visita do Papa ao Brasil centrada no Rio de Janeiro provavelmente dará ao mundo a imagem almejada de força da Igreja Católica difícil de obter em outra parte do planeta. Assim como, à Basílica de Aparecida, seria um sinal de humildade e respeito aos católicos do Brasil. É um roteiro óbvio e apenas diplomaticamente obrigatório para o chefe supremo da religião. Como já se viu antes, porém, não produz os efeitos práticos e morais dos quais necessitam os apostólicos romanos e o Brasil.

Soa ainda mais acanhado e burocrático quando se trata de um latino-americano e jesuíta a ignorar a porção setentrional da nação, onde se dão as manifestações mais expressivas do catolicismo.
                                                                            Foto:Mara Paula
Fé caudalosa em terra seca
 A desigualdade social característica do continente pode não ser historicamente tão gritante na Argentina, mas Dom Bergoglio a conhece como poucos no Vaticano. Deve ter ouvido falar muito dela, já que entre seus amigos estão brasileiros como o franciscano Dom Claudio Hummes, cuja aproximação, de acordo com suas declarações, inspirou o nome Francisco.

É na fé em Deus e na esperança de solidariedade que cerca de 60 milhões de brasileiros se mantêm nas terras semiáridas que se estendem do norte de Minas Gerais até o Piauí, clamando em suas orações que façam por eles. Neste contingente se incluem também os que só encontram em Deus ouvidos para desabafar sobre as condições análogas à de escravidão no trabalho em fazendas. Levantamento da Comissão Pastoral da Terra registra que do total de 2.653 pessoas resgatadas da escravidão em todo o território no ano passado, 1.477 foram no norte e no nordeste.
                                                                        Foto:Alexandre Mazzo
E se eles vissem o Papa de perto? 
Na viagem, entre 22 e 28 de julho, Francisco prioriza arrebanhar jovens na porção sudeste do país. Serviria mais à causa  alentando pessoalmente o sofrimento das maiores vítimas da, segundo suas próprias palavras, “ditadura da economia sem fisionomia e nem objetivo realmente humano”. A elas o governo federal anuncia o destino de R$ 9 bilhões para aplacar a dor e precisa da compaixão dos gestores dos recursos para que cheguem a quem precisa, afastando a "corrupção tentadora", como disse o Papa.

Há mais pontos em comum do que divergências entre a presidenta do Brasil e o sucessor de Bento XVI. A política de desenvolvimento humano brasileira, reconhecidamente eficaz por organismos internacionais, é atualmente o mais concreto exemplo da "corajosa mudança de atitude dos dirigentes políticos" exortada no discurso crítico ao modelo neoliberal.
                                  Foto:Roberto Stuckert Filho
Dois polos, uma causa
Um sinal de boa vontade de ambos os lados, hoje uma fria relação protocolar, seria útil aos propósitos, sem prejuízo de suas posturas ideológicas e orientações comportamentais.

Não se espera que o Papa faça chover na caatinga, mas uma luz sobre a região e seu povo, uma passagem rápida com um breve discurso, como fez em relação ao incêndio na casa noturna de Santa Maria, bastaria para reforçar o ideal de São Francisco e os princípios da ordem que escolheu.
Jesuítas: no Brasil desde 1549
O jesuítas avançavam para onde seus pares não tinham coragem ou desejo de seguir. Abdicaram do conforto em prol da ampliação de seu rebanho com o objetivo de impedir o crescimento do protestantismo no século XVI, situação semelhante ao avanço recente de outras correntes cristãs no país, inclusive no Congresso Nacional. Retomando simbolicamente a prática, poderiam também se redimir da faceta cruel da colonização. 
Uma visita verdadeiramente jesuítica faria muito bem à alma de Francisco, à igreja, ao Brasil e a seu povo, bem como àqueles em todo o mundo que desejam paz e fraternidade para além da retórica.  

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