Yes, nós temos terror


Lei antiterrorismo vista como retrocesso aos anos de chumbo mostra temor justificável  numa lógica perversa.  Levar em conta o contexto histórico é fundamental para uma discussão séria, sem demagogia ou oportunismos.

Em momentos anteriores, do período colonial à ditadura do SNI personificada no general Figueiredo, leis e decretos foram costurados casuisticamente, com a finalidade única de chancelar atos dos governantes com o propósito de impedir estorvos ou desconfortos no exercício do poder.

Agora, apenas o fato do assunto vir a debate revela a inédita consolidação da democracia e o avanço na liberdade de manifestação.  Discutir os limites das liberdades individuais e coletivas, bem como métodos e responsabilidades de seu cumprimento, é sinal de maturidade política e social, não um retrocesso.

Há quem defenda a inexistência de grupos terroristas no Brasil, na sua definição clássica. Em favor destes, não se conhece, ao menos por ora, evidências concretas de ligações de black blocs a partidos políticos. No entanto, os brasileiros temos convivido com células que se enquadrariam como grupos terroristas já por algum tempo. Quadrilhas como PCC, Comando Vermelho e congêneres extrapolam o banditismo e o tráfico, difundindo terror na imposição de leis de silêncio e desafiando poderes constituídos com balas e palavras.  As leis que suportam as ações destas organizações, quando muito, as desmobilizam temporariamente, não são suficientes para desmantelá-las.

Na percepção desta falha surgiram as não menos terroristas milícias e grupelhos parapoliciais, que através do medo achacam gente de bem e passaram a disputar o controle das periferias com aqueles. A lacuna foi exposta na condenação dos milicianos responsáveis pela morte da juíza Patrícia Acioli. A organização criminosa saiu incólume.

Também não foi outra coisa senão terrorismo a invasão recente do centro de treinamento do Corínthians, com estrangulamento literal do atacante Guerrero e ameaça a outros atletas. As torcidas organizadas tomam as ruas, quebram carros, casas e lojas, agridem pessoas e enfrentam a polícia a caminho do estádio.  Com sua forma difusa, de lideranças pulverizadas e sem objetivos definidos além da pura violência, são como os black blocs, inclusive na prática de esconder o rosto durante as manifestações. 

As organizações terroristas estão aí, aterrorizando, além de cometerem crimes já previstos. Prometem muito mais durante a Copa do Mundo, e, por isso, em nome da cautela, alguns defendem leis antiterroristas a viger somente durante o torneio. Seria como entregar de uma vez a Presidência da República a Joseph Blatter, presidente da Fifa. É ironia de mau gosto a uma nação aterrorizada. Abre um precedente de exceção na democracia.

A questão deve ser discutida aberta e exaustivamente, a fim de impedir que novas leis se sobreponham às existentes no código penal quanto a agressões, roubos, assassinatos, sequestros, estupros, etc.,  ou possibilitem o estabelecimento de períodos de exceção ou controle da liberdade de expressão.
Não houve antes na terra de Vera Cruz momento mais propício.

( texto publicado originalmente em fevereiro)

 

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