Conspiração com jabuticabas


A Copa em ambiente de crise financeira mundial e antecedendo eleições no país-sede tem gerado mais teorias conspiratórias que o habitual.

Começou cedo. Depois que o técnico da Inglaterra repudiou jogar em Manaus antes do sorteio que o mandou exatamente para lá na estreia entre as 12 sedes, surgiram as especulações em torno da formação dos grupos na primeira fase, quase ofuscadas por um decote.

Entre os desconfiados, por aquela fenda entraram olhos e esvaiu atenção à manipulação das bolinhas. Foi a primeira jabuticaba da Copa 2014.

O arranjo de resultados é comum em torneios nacionais no continente natal da FIFA, espalhado pela Ásia via sites de apostas e vez ou outra flagrado na América do Sul - as viradas de mesa do Fluminense não contam aqui.

 As suspeitas de origem política e econômica acompanham a Copa praticamente desde o início. Na de 38, a força do fascismo teria levado a Itália ao segundo título consecutivo.

Na de 78, na Argentina, a goleada de 6 a 0 dos donos da casa sobre o Peru tirou o Brasil da final por saldo de gols. Jogadores do Peru acusaram colegas de favorecimento aos adversários.

A copa de 98 deu na CPI da Nike, com a escalação do Ronaldo convulsivo e suposto arranjo em prol da França.  A suspeita era da participação de patrocinadores na escalação do time.

Em 2006 cheguei para cobertura dos treinamentos da seleção ainda na Suíça com duas informações quentes: a primeira, de fonte segura, era a garantia de que o Brasil sediaria a Copa 2014. Por esta razão, não poderia ganhar naquele ano.  A segunda, de fonte duvidosa, informava que por razões econômicas a Itália teria o caminho facilitado para chegar à final. Divulguei sobre a escolha da sede sem falar de eliminação brasileira por acreditar que isso seria uma conclusão lógica da fonte, e não um dado concreto. Sobre a Itália falei quando as especulações em torno de manipulação se tornaram assunto devido às projeções do mercado financeiro, como acontece agora. As análises dos economistas indicavam que a Itália participando da final impulsionaria a economia o suficiente para igualá-la em produção e consumo a seus parceiros da União Europeia.

Havia grande expectativa entre os torcedores, principalmente alemães, de que a final fosse entre os anfitriões e o Brasil, os dois melhores times em revanche da final da Copa de 2002. Eu cobria a França antes do jogo contra a seleção brasileira. Os franceses na porta do hotel exibiam confiança. Um coral de poucos homens trajados com pijamas cantava  animadamente uma versão de “O que será”, de Chico Buarque:   “Ah, tu verras, tu verras...”

Os bleus, em hora de folga, saíram em conjunto para um passeio, me chamando a atenção pela serenidade diante dos fãs e a calma antes da partida contra o campeão mundial e da Copa das Confederações com atuações galantes de Adriano, Robinho, Ronaldinho Gaúcho e Kaká.

Comentei minha impressão com uma repórter francesa que os acompanhava há muito.  Disse-me também estranhar e ter questionado um dos jogadores. Segundo ela, a resposta em tom enigmático foi direta:

- Vamos ganhar esta partida, você vai ver.

A autoconfiança à beira da soberba é marca da cultura francesa, mas não conquista vitórias.  Teriam que mostrar superioridade em campo. Mostraram.

Olhar para trás com a visão viciada dá à imaginação uma concretude que a realidade não confirma. Nem por isso a imaginação para de correr.

O mercado financeiro nesta Copa usa algoritmos e fórmulas mais complexas que as anteriores, avançando por teorias matemáticas e se distanciando do comportamento humano.  Instituições financeira de grande porte preveem a final entre Brasil e Argentina, com vitória dos canarinhos por 3 X 1, uma filigrana da era do processamento em alta velocidade dos dados sobre PIB, população, capacidade produtiva, potencial de consumo, população, etc.  Alemanha e Espanha sucumbiriam no cruzamento de dados entre demografia, meteorologia e perspectivas econômicas.  O prognóstico é verossímil e um dos mais conservadores entre as possibilidades, mas, em campo, Brasil, Holanda, Alemanha, Argentina e Itália são imprevisíveis.  Há ainda as emergentes  França e Espanha.

Se a linha conspiratória é o norte, existe uma segunda jabuticaba nesta copa. Não escapa a mais ninguém a desavença entre a FIFA e o governo brasileiro. Medindo pelas declarações de Jérôme Valcke,  secretário-geral da FIFA, de Ronaldo e de Joana Havelange, integrantes do Comitê Organizador Local, de birra o Brasil passaria vergonha.

É escolher a conspiração e começar a torcer...

 

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