Endinheirado e rico
são distintos. Um dos obituários de Antônio
Ermírio de Moraes conta o costume de frequentar o mercado do Ceasa às 6:30h,
quando a maioria da cidade que não dorme dormia. Se não fosse uma das grandes
fortunas do país, seria taxado de muquirana.
Em seu palácio empresarial, atrás do Teatro Municipal, em São
Paulo, recebeu a mim junto de equipe de TV por duas ou três vezes para
entrevistas. Eram avaliações sobre os
quadros político ou econômico do momento. Nos fins dos anos 80, uma e outra mudavam
agudamente da noite para o dia. Antônio Ermírio, com contatos e uma visão mais ampla
que seus pares, dava boa conversa. Aparecia
com ternos de cores neutras, às vezes cinza, às vezes mostarda, irremediavelmente
mal ajambrados no corpanzil de mais de 1,90m. No cotidiano, afável, mas esbaforido, era uma
figura diferente do sorridente de smoking apresentado nas colunas sociais.
Certa vez emparelhei casualmente meu carro ao dele, na
avenida 23 de maio. Estava sentado ao
lado do motorista. Acenamo-nos rapidamente. Seu gesto esclareceu qual das duas
imagens retratava melhor o empresário. Levava no pulso um relógio barato de
pulseira plástica. Contou-me depois que seguia do hospital que dirigia por filantropia, a Beneficência Portuguesa, para a
Votorantim. Indagado sobre o relógio, disse que o usava para não chamar a
atenção, pensando também na própria segurança.
Lembrei-me da história anos depois, na área de desembarque
internacional do Aeroporto de Cumbica. Na Esteira de malas, entre marcas de
grife e modelos ostensivamente caros, um tipo retangular de vinil preto, estufado,
amarrado com cinto e laço vermelho na alça me chamou a atenção. “Deve ser de
algum ricaço”, pensei. No meio do
trajeto, foi pescada por Paulo Maluf.
Sorri de leve ao perceber que tinha aprendido com Antônio
Ermírio a identificar um rico de verdade.
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