Cancelamento de debates por redes de tv empodera a internet e aumenta risco de distorção da opinião pública.
As redes de televisão CNN e Record anunciaram que não farão
debates no primeiro turno das eleições de 2020. Segundo as emissoras, o grande
número de candidatos a prefeito – em São Paulo são 14 - e o distanciamento
recomendado por causa da pandemia inviabilizaram o evento.
O SBT já havia anunciado a desistência. A tv Globo negocia
com os partidos a redução do número de participantes. A emissora só deverá realizar
debates onde houver consenso de que no máximo 4 candidatos à frente das
pesquisas Datafolha ou Ibope participem.
O único confronto direto deve se restringir ao debate transmitido
pela tv Band, no dia primeiro de outubro.
As emissoras mantêm agendados os debates para o segundo
turno.
Por que tantos candidatos?
A multiplicação de candidaturas ao cargo majoritário é principalmente
decorrência da alteração da legislação eleitoral para a disputa aos cargos
proporcionais. Até 2016, a bancada de vereadores era definida pela proporção de
votos obtida pela coligação, dividida entre os partidos que a compõem segundo
os votos obtidos por cada partido.
Com a mudança, a soma de votos da coligação deixa de valer.
Cada partido será representado segundo a proporção de votos da sigla. Assim, a
legenda necessita da maior visibilidade ocasionada por um representante na
disputa do cargo majoritário. O candidato a prefeito é um puxador de voto em
potencial para a legenda.
Crise política
A desorganização política advinda da operação Lava-Jato e o
impeachment da presidente Dilma Roussef também favoreceu a profusão de
candidaturas. Com o abalo do partido mais consistente do país, o PT, e o
desmanche do PSDB, outras agremiações historicamente aliadas a elas, como MDB,
DEM, PSD, Rede, PSOL, PCdo B e PDT, encontraram espaço para ganhar musculatura.
O avanço da extrema direita nas últimas eleições
presidenciais catapultou siglas nanicas deste campo, como PSL e Patriota, e
gerou a criação do Novo.
Debate ruim
As regras estabelecidas pelos partidos para o único encontro
entre os candidatos a prefeito tornou o evento burocrático, não clareou para o
eleitor pontos cruciais dos projetos superficialmente apresentados.
No caso de São Paulo, ficaram de fora os três últimos
colocados da pesquisa Datafolha, o PSTU, o PCO e o PRTB.
Organizar o debate com 11 candidatos não é tarefa simples,
mas o formato adotado não foi a melhor escolha. Os tempos entre 30 e 40
segundos para cada intervenção impediram o desenvolvimento do discurso e da
estratégia. Pouco se viu de prioridades e soluções para as questões de maior
interesse do eleitor.
No calor direto da pandemia, transporte e renda tiveram
maior atenção. Porém, o telespectador pouco recebeu para se posicionar. O
confronto direto entre os candidatos, como ocorreu em alguns momentos, talvez
se mostrasse mais produtivo do que o excesso de intervenções de jornalistas.
O ponto positivo foi a preocupação dos candidatos de se
mostrarem mais racionais e objetivos, o que não se vê nas redes sociais.
Sem debate, campanhas mais polarizadas
No ambiente propenso aos ataques pessoais e agressivos das
redes sociais, as campanhas tendem a explorar o lado pessoal dos adversários,
empobrecendo as discussões de maior interesse da população.
Fora dali, o eleitor terá apenas o mal afamado horário
eleitoral gratuito, onde os candidatos deverão administrar respostas ao que
vier das redes.
Este cenário pode distorcer a representatividade das
candidaturas. O engajamento do ambiente virtual não reflete necessariamente a
aprovação e o comprometimento do eleitor com um ou outro nome. No entanto, pode
influenciar emocionalmente a escolha do eleitor. Candidaturas fracas podem
parecer robustas o bastante para carregá-lo em uma onda na qual não embarcaria
no mundo real.
Não há mecanismos satisfatórios ainda para evitar o que se
viu nas últimas eleições presidenciais no Brasil nos Estados Unidos e na
votação do Brexit.
Web X Tv
A comparação entre a última pesquisa de opinião em São Paulo
e a popularidade nas redes mostram claramente a distorção que a concentração da
campanha na internet pode gerar.
Segundo pesquisa do Ibope, publicada pela revista Veja, Russomanno
(Republicanos), Covas ( PSDB), Boulos ( PSOL) e França (PSB), são,
ordenadamente os primeiros colocados nas pesquisas. O levantamento foi feito
entre os dias 30 de setembro e 1º de outubro com 805 eleitores. A margem de
erro é de 3 pontos percentuais.
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Elaboração: Revista Veja |
O índice de popularidade nas principais redes sociais, apurado pela empresa Quaest, publicada pela Folha de São Paulo, revela, também em ordem decrescente, Boulos, Arthur do Val ( Patriota) e Russomano, O quarto colocado, Andrea Matarazzo ( PSD), está praticamente empatado com Marina Helou ( REDE) e Joice Hasselmann ( PSL). Os três têm 1% de intenção de voto, mas atropelam Covas e França.

Popularidade não significa intenção de voto, mas poder de influência. Transformar esta liderança virtual em convencimento real, no entanto, depende mais da competência no uso de tecnologias do que de convencimento.
As campanhas de Covas e França afirmam que priorizarão o
horário eleitoral. Se mantiveram a postura, serão boas réguas para mensuração
do efeito redes na eleição.
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