Viva, México!

Política
AMLO, fruto da maturidade política mexicana

A onda global de descontentamento com o establishment e os ataques discriminatórios de Trump não bastam para explicar a vitória da esquerda nas eleições mexicanas.

Há quase trinta anos o México se tornava a vitrine da modernização à direita na América Latina. Ao longo deste tempo, tem se deteriorado tanto como nação como quanto país capaz de manter sua soberania no bloco econômico do Nafta. Os indicadores econômicos e sociais do país apontam que o modelo falhou.

A configuração do plano neoliberal desenvolvida a partir do governo Miguel de la Madrid (1982 – 88), defensor inconteste do Plano Brady, e efetivada no mandado de Salinas Gortari (1988-94), reduziu o déficit público à custa do baixo crescimento e do aumento real da pobreza.
 O programa do desenvolvimento social, com geração de emprego via regime de mutirão, tornou-se um método assistencialista gerenciado pelo coronelismo regional. O acordo comercial com os EUA e Canadá resultaram em mão de obra barata e postos de trabalho de menor qualificação. O México não se beneficiou dos investimentos, cujos retornos são remetidos às sedes americanas.

A violência explodiu na forma dos cartéis da droga ocupando o espaço que caberia às políticas públicas no controle social. A resposta, o envolvimento do exército no combate ao crime, aumentou o índice de mortes violentas.
A plataforma do candidato vencedor pelo Movimento Regeneração Nacional – Morena - foi centrada na ingerência do Estado no combate à desigualdade, da violência e da corrupção.
Subornos e negociatas escusas não são primazia de qualquer linha ideológica. Porém, o sistema marcado pela privatização de parte da principal estatal do país, a petrolífera Pemex, e liberar o fluxo do capital estrangeiro no país não reduziu a corrupção percebida desde a supremacia do PRI. Ao contrário, a percepção do crime aumentou junto à população, segundo a curva das pesquisas de opinião pública divulgadas nos últimos anos.

 Comparado a Lula por analistas do primeiro mundo, Andrés Manuel Lopez Obrador terá neste campo seu maior desafio, pois as ações neste sentido, quando não ineficazes, têm motivado profunda instabilidade política.
Após duas tentativas, a vitória de agora advém das experiências exitosas da esquerda em governos democráticos como os do Brasil e da Bolívia no combate à desigualdade. São elas que deram credibilidade a seu discurso.
"As mudanças serão profundas, mas serão realizadas dentro da ordem estabelecida. Haverá liberdade empresarial, de expressão, de associação e de crenças”, declarou o presidente eleito com mais de 53% dos votos. Considerar a vitória de AMLO, como é chamado, fruto de desilusão ao universo político é, no mínimo, precipitado.

A participação no pleito foi de redondos 65% da população, em linha com o que se verifica na maioria dos países de voto não obrigatório. A guinada do México para a socialdemocracia, portanto, reflete maturidade política na análise feita pela população.

Os candidatos derrotados, à direita e à esquerda de AMLO, reconheceram imediatamente a derrota sem constatações, outro sinal de consolidação da democracia ainda almejada entre os pares da América do Sul.

A credibilidade e a sustentação de Obrador são aparentemente superiores aos de presidentes eleitos neste período marcado por turbulências e intolerâncias. Em pouco tempo ele poderá se tornar referência para a região.