Lâmpada e Luz



Bam! O estouro de uma lâmpada fluorescente é mais assustador que o perigo real que causa. O convidado ainda estava de olhos esbugalhados, e eu, entrevistador, engolia à seco o coração quando Seu Edison entrou no estúdio seguido do assistente carregando a lâmpada nova e o banquinho.

- O teto é baixo, a sala não está toda adaptada, desculpe. Vamos continuar, está bom! 

Aconteceram mais duas explosões até o fim da gravação, assistida com entusiasmo através da parede de vidro por Seu Edison.  Ele não arrefecia do propósito de ver logo pronto o programa da nascente TV Minas, então improvisada em um conjunto de salas na Av. Rio Branco.

Se havia contratempo ou tensão, fosse qual fosse a densidade no ar, Seu Edison sabia lidar com delicadeza e bom humor, sem causar constrangimentos ou acirrar o conflito. Conheci seu modo direto e afável pouco antes. Recebera-me por solicitação de uma amiga, com o pedido de emprego e um diploma fresquinho de jornalismo na mão. 
Ambos estreávamos no mundo da televisão. O que me faltava de segurança, nele sobrava de arrojo. Criar uma TV na época exigia muita coragem e fôlego empreendedor. Entre negociações com bancos e políticos e reuniões com técnicos para levar a emissora ao ar, me atendeu sentado confortável como quem volta de uma sesta. 

- Bem, com este bigodinho e esta barbichinha não dá, tem que tirar isso. 

De pronto, no gozo da petulância juvenil, apertei o cerco:
- No passado, bastava arrancar um fio do bigode para firmar um contrato. Se o senhor me pede para tirar tudo, então é pra ficar de vez...

A reação teve o tirocínio e o tempo exato dos melhores comunicadores de rádio. Depois do sopro de silêncio, riu alto sem menosprezo, emendando que eu passasse os documentos para a secretária e começasse no dia seguinte.  Ele fora locutor, deve ter sido dos bons, mesmo confessando certa vez ter sonhado virar cantor. Já dono de rádio e gravadora, ainda jorrava paixão de iniciante, sem descuido da razão e da generosidade de ensinar. Dos meus arroubos de reportagem, guardei:

- É assim quando a gente é novilho, sai dando chifrada nos mourões para se livrar do curral de qualquer jeito. Mas depois de muita cabeçada a gente aprende a melhor saída. 

Segui dando cabeçadas e procurando a melhor saída, ouvindo de longe as conquistas políticas e empresariais de quem associo ao leão. Percebi que manteve todo o tempo intacto o instinto do verdadeiro homem liberal, bicho raro entre nós. 

De repente, ”bam!”, quando tão imprescindível, a lâmpada estoura. É o perigo real de viver. A gente toma um susto, mas a voz acalma: “vamos continuar que está bom”. Com seus grandes faróis azuis, Seu Edison nos iluminará para sempre.